UBAM (União Brasileira de Municípios) vai cobrar a suspensão imediata da cobrança da CPMF, além do ressarcimento aos Estados e Municípios, de todos os valores por ela arrecadados. Criada com a finalidade de custear a saúde pública, a CPMF incide sobre a movimentação ou transmissão de valores e de créditos e direitos de natureza financeira. O problema, segundo defende a UBAM é que alguns aspectos apontam a ilegitimidade da cobrança, portanto a inconstitucionalidade da CPMF.
A Emenda Constitucional n.º 12/96 autorizou a União a instituir a contribuição provisória sobre movimentação financeira, sob a alíquota de 0,20%. E o produto da arrecadação deveria ser destinado integralmente ao Fundo Nacional de Saúde, para financiamento das ações e serviços de saúde. Determinava ainda a Emenda que a cobrança duraria, no máximo, 2 anos. A Lei 9.311/96, que instituiu a CPMF, determinou a sua cobrança por 13 meses - de 23 de janeiro de 1997 a 23 de fevereiro de 1998. Posteriormente, foi modificada pela Lei 9.539/97, que prorrogou a cobrança até 23 de janeiro de 1999. Findo tal prazo, não mais seria cobrada. E foi o que ocorreu. No entanto, em 19 de março de 1999 foi publicada a Emenda Constitucional n.º 21/99, que prorrogou a cobrança da contribuição por mais 36 meses, a partir de junho de 1999. Nos primeiros 12 meses, com a alíquota de 0.38%, e de 0,30% nos meses subseqüentes, disse Leonardo Santana, Presidente Nacional da UBAM.
“Podemos dizer então que, qualquer emenda que prorrogue a cobrança da CPMF, será objeto de uma lei que não existe mais. A lei deixou de ter seus efeitos, como, pois, poderia sofrer emendas, não mais existindo?” , defende o Presidente Nacional da União Brasileira de Municípios, Leonardo Santana.
“Desde 23 de janeiro de 1999 as Leis 9.311/96 e 9.539/97 não mais produziam efeitos, vale ressaltar, não produziam mais qualquer efeito no mundo jurídico e, por isso, jamais poderiam ser prorrogadas. A Emenda Constitucional 21/99 prorrogou o vazio, ou o nada, sendo, portanto inconstitucional e ao mesmo tempo uma afronta ao direito constitucional”, destaca Santana.
O Presidente Nacional da UBAM garantiu que, além dessa, várias outras irregularidades tornam a cobrança da CPMF ilegítima e inconstitucional. A Constituição proíbe expressamente a cobrança de tributos no mesmo exercício financeiro em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou. Quer dizer, se a lei que criou ou aumentou um imposto foi publicada em 1999 o início da cobrança só se dará, necessariamente, no ano seguinte, e nesse particular, em 2000. Trata-se do princípio da anterioridade, e a emenda 21/99 também não respeitou o dispositivo da Constituição que o estabelece. O próprio STF, em sua Súmula 67, entendeu que "é inconstitucional a cobrança de tributo que houver sido criado ou aumentado no mesmo exercício financeiro".
“A referida emenda alterou, ainda, a destinação dos recursos arrecadados com a CPMF, ou seja, alterou a finalidade da lei, o que caracteriza imoralidade pública. Segundo dispõe a emenda, o resultado do aumento da arrecadação nos anos de 1999, 2000 e 2001 será destinado ao custeio da previdência social, contrariando o que estabelecia a Emenda 12/96, que destinou a totalidade dos recursos à área da Saúde. Vários direitos constitucionais do povo brasileiro foram escandalosamente violados com a publicação da Emenda 21/99.”
Santana elencou alguns direitos dos cidadãos que, segundo ele, foram violados, sem que nenhuma outra entidade municipalista ou de política partidária, ou ainda o próprio parlamento tenha defendido a população e os municípios, veja abaixo:
1. Princípio da Isonomia (art. 5º, caput) - Proíbe tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente e o tratamento igual entre os que se encontram em situações diferentes.
2. Capacidade contributiva (art. 145, § 1º) - Os impostos devem ter caráter pessoal e ser graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte. A CPMF cobra a mesma alíquota de todos, indistintamente.
3. Princípio da Proibição do Confisco (art. 150, IV) - Embora não seja fácil o entendimento do que seja um tributo, com efeito, de confisco certo é que o dispositivo constitucional pode ser invocado sempre que o contribuinte entender que o tributo, no caso, está confiscando-lhe os bens. Cabe ao Judiciário dizer quando um tributo é confiscatório. A regra constitucional, no mínimo, deu ao Judiciário mais um instrumento de controle da glutonaria fiscal do Governo, cuja utilidade certamente fica a depender da provocação dos interessados e da independência e coragem dos magistrados. Assim, tributação jamais pode ter conotação confiscatória, inclusive sob pena de descaracterizar a natureza tributária e ingressar no campo da punição ou da penalidade. O tributo torna-se confiscatório quando, de modo indireto, expropria a renda ou propriedade do contribuinte ou anula os ganhos decorrentes de exercícios de atividade lícita.
4. Princípio da Propriedade (art. 5º, caput e inc. XXII) - A Constituição garante aos brasileiros e estrangeiros que aqui vivem a inviolabilidade do direito à propriedade, que não pode sofrer violação, restrição ou limitação de qualquer natureza.
5. Princípio da não dupla tributação - Ocorre dupla tributação quando a União, Estado, Município ou o Distrito Federal criam tributo cujo fato gerador (evento a que a lei adstringe a obrigação de pagar o tributo) e base de cálculo são próprios de tributo de competência de outro ente político, ou quando o mesmo ente cria tributo, sob denominação diversa, mas cujo fato gerador e a base de cálculo pertencem a tributo já existente. O contribuinte não pode ser cobrado mais de uma vez por um mesmo evento, pois já paga imposto sobre a renda (IR), sobre operações financeiras (IOF).
Sendo assim, continuou Leonardo Santana, a Constituição proíbe, por meio de cláusula pétrea, quer dizer, por disposição irrevogável, a deliberação ou discussão de proposta de emenda tendente a abolir, entre outras matérias, os direitos e garantias individuais (art. 60, § 4º, IV). A Emenda 21/99 ignorou tal vedação e, ao prorrogar a cobrança da CPMF, violou o direito e garantias individuais dos cidadãos, como acima se demonstraram.
Um exame mais acurado da matéria certamente apontaria outros elementos que só confirmariam a já cristalina inconstitucionalidade desse malfadado tributo.
Se não bastasse o evidente desrespeito à Constituição e aos direitos dos cidadãos nela esculpidos, é de causar espanto quando os Tribunais cassam liminares que haviam suspendido a cobrança da CPMF, deixando-nos a impressão de que essas decisões têm caráter político e não jurídico, como deveria ser.
O Estado, como instituição politicamente organizada, precisa e deve ser mantido pela contribuição dos cidadãos, para que possa prover as necessidades sociais. No entanto, esta contribuição-dever deve ser dada de acordo com a possibilidade econômica de cada um. Se por um lado é um dever, por outro passa a ser um direito do cidadão exigir daqueles que, por uma razão ou outra, deixam de empregar o dinheiro público na concretização do bem-comum ou o fazem em desacordo com as leis vigentes, além do visível desvio de objetivo para o qual foi instituído o “imposto”, mascarado de “contribuição”, sob o argumento oculto de que os entes federados - Estados e Municípios – não recebem, pois esse tributo não entra na fatia do rico e pomposo bolo tributário, aumentando apenas a parte que cabe ao governo central, mostrando mais ainda o flagelo da desigualdade promovida por ele, desencadeando um processo de sucateamento da máquina na esfera municipal, já cambaleando depois das sucessivas perdas nos repasses do FPM, atrelado injustamente ao significativo aumento das responsabilidades sociais dos entes federados, seja, com a saúde, educação e segurança pública.